Seria um dia comum de trabalho para os músicos, para os seguranças e colaboradores da Sala São Paulo, se não fosse o friozinho ardido e a garoinha fina que caía na capital paulistana.
Deus, o maior maestro de todas as orquestras, a natureza, preparou tudo para que nada desse errado. Um dia adorável para tomar um chocolate quente, que é servido lá mesmo, vestir aquele casaco de lã e um cachecol charmoso que já estava guardado para o próximo inverno.
Por causa do frio, ou por causa a ansiedade do público, antes do terceiro sinal, o recinto do concerto já estava cheio, na verdade lotado, eu nunca antes tinha percebido aquela sala tão cheia como estava no último sábado.
Um a um vão entrando no picadeiro os mágicos, as estrelas do dia. De repente uma mão misteriosa puxa as palmas para a entrada do spalla Cláudio Cruz e logo após para o mágico dos mágicos daquela orquestra, o maestro Roberto Minczuk, que é também diretor artístico adjunto da Osesp e regente associado da Filarmônica de Nova York.
O desafio daquela tarde estava escrito em cada partitura, todas as dicas para conseguirem executar perfeitamente as mágicas propostas. Ao todo eram quatro peças, a primeira “Rapsódia espanhola” de Ravel parecia ser feita do mais frágil cristal ou da mais rara porcelana. De tão delicada e sutil que era.
Como num passe de mágica, os contra-regras fizeram surgir do chão do palco um lindo piano preto de calda. Brilhante e impecável.
Novamente as mãos misteriosas chamam as palmas para mais um mágico que entrara em cena. O pianista russo Alexander Toradze, magestosamente executou o Concerto número 1 de Tchaikovsky. Uma peça considerada mal composta e impossível de ser executada pelo pedagogo e pianista Nikolaai Rubinstein, diretor do Conservatório de Moscou. Ainda bem que ninguém levou a sério essa avalição, senão não teria sido realizada uma das maravilhas desse mundo.
Existem coisas e músicas que quando ouvimos num cd ou vimos na televisão parecem ser de mentira, uma montagem, mas quando os mágicos de uma orquestra se juntam, eles fazem a música acontecer de verdade, bem ali, na sua frente, ao seu alcance. Essa peça de Tchaikovsky é um exemplo de música de mentira que fez materializou ali na minha frente, uma música que sempre ouvi, sempre sonhei e sempre fingi tocar. Alexander Toradze tocou.(continua...)
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